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#1 - Extensão e Sociologia


Link para o episódio no Anchor: https://spotifyanchor-web.app.link/e/7WGk3jWTcxb


Neste piloto você irá conhecer melhor o Sociologia em Movimento, seus feitos e repercussões. Além disso, vai conferir um bate-papo com três mulheres que têm tudo a ver com o projeto de extensão: Julia Audujas, nossa fundadora, Márcia Gobbi, nossa orientadora e Mairin Saito que nos estudou por mais de um ano para sua dissertação de mestrado. Acompanhe a gente nas redes sociais ou pelo nosso site.


Transcrição - Episódio Piloto "Extensão e Sociologia"


Começa música da vinheta de abertura, Amor Chiquito de Quincas Moreira.


[Gabriel]

Eai pessoal, eu sou o Gabriel!


[Maria]

Eu sou a Maria,


[Ricardo]

Eu sou o Ricardo,


[Sofia]

E eu sou a Sofia.


[Gabriel, Maria, Ricardo e Sofia]

E esse é o Sociologia em Podcast!


Música da vinheta fica mais alta, em ritmo caribenho e animado, e vai diminuindo conforme as falas dos apresentadores começam.


Gabriel: Nós somos um grupo de estudantes da Universidade de São Paulo que trabalha com educação e ciência sociais. Nesse podcast a gente vai conversar sobre diversos temas relacionados à Ciências Sociais. A gente vai fazer entrevista com estudantes, professores e pesquisadores e falar de diversos temas, como religião, cultura, ciência, raça e gênero.


Sofia: Nesse episódio, iremos falar um pouco mais quem somos e no que acreditamos. Conversar sobre algumas de nossas atividades e a repercussão do projeto. Além disso, vamos ouvir três pessoas muito importantes para gente, nossa fundadora Julia Audujas, a nossa orientadora Márcia Gobbi e Mairin Saito, que estudou nossa atuação por mais de um ano e escreveu uma tese de mestrado sobre juventude e sociologia. Então, não sai daí!


Maria: O Sociologia em Podcast é um projeto que nasceu da necessidade do nosso grupo de extensão de se comunicar melhor com o público em geral e especialmente com os professores de sociologia. Essa comunicação sempre foi um dos objetivos do Sociologia em Movimento, grupo de extensão da Faculdade de Educação e no curso de Ciências Sociais da USP. Mas, afinal, o que é um grupo de extensão?


Ricardo: Maria, a extensão é um dos tripés da universidade pública. É o que conecta a universidade com o mundo que a cerca, é através da extensão que a universidade pode trocar o conhecimento que ela gera com a sociedade que financia sua existência. A extensão Universitária pode ter as mais diversas formas, muita das vezes ela se volta a projetos de educação.


Sofia: E esse é o caso do Sociologia em Movimento. O grupo surgiu em 2015, quando alunos do curso de Ciências Sociais começaram a se encontrar com estudantes do ensino médio de uma escola pública estadual para discutir diversos temas relacionados à sociologia.


Maria: Nós falamos sobre criminalidade e violência policial, racismo e machismo. Já conversamos também sobre pichações e fotografia. Enfim, nós já aprendemos muito com os nossos alunos e, eles, acreditam eu, eu acho que todo mundo espera isso, também aprendem muito com a gente. É esse o princípio do Sociologia em Movimento, aprendizado mútuo, todos temos muito a aprender e muito a ensinar também.


Ricardo: E é com esse princípio em mente que embarcamos nesse novo projeto. Mas pera aí, vamos falar um pouco mais sobre que princípios são esses. Afinal, nós não tiramos eles do ar.


Toca-se a melodia de transição entre quadros, Josefina de Quincas Moreira, em ritmo de forró.


Gabriel: A gente entende a extensão por uma ótica de Paulo Freire, que traz a ideia de não estender o conhecimento para fora, mas sim criar uma comunicação com a sociedade em geral e fugir do princípio que a universidade produz conhecimento e a sociedade o recebe. Mas reconhecer que a sociedade produz conhecimentos também, e constrói uma ponte para que os dois lados troquem o que descobriram, o que pensam e o que sabem.


Maria: Para isso, vamos sempre tentar aproximar a nossa audiência da discussão no podcast, chamando alunos e professores de Escola Pública.


Gabriel: Nós queremos a sua participação! Por isso, você pode enviar perguntas e especialmente mensagens de áudio para as nossas redes sociais, o link tá sempre disponível na descrição do podcast.


Sofia: A educação libertadora, que mantém os princípios do grupo, é aquela que não pensa os alunos como aqueles que estão lá apenas para receber conhecimentos, ela propõe que todas as envolvidas são pessoas sujeitas de conhecimento, educandas e educadoras. Todas, têm algo a contribuir para o processo educativo, pois são sujeitos buscando saber e transformar o mundo conjuntamente. Por isso, o Sociologia em Movimento, entendemos a importância do professor conhecer o contexto dos alunos a partir de referências para os seus estudos e assim estabelecer um diálogo para ouvir os educandos e estimular o processo de conhecimento do mundo numa visão crítica da sociedade que os cerca.


Ricardo: Agora a gente vai conversar com Julia Audujas, uma das fundadoras do nosso grupo. Ela que acompanhou todo o processo de formação do grupo e essas bases e ideias que a gente leva até hoje. Tudo isso aconteceu quando ela estava na graduação de Ciências Sociais, como a gente hoje em dia, mas ela já se formou e, atualmente, é professora de sociologia e faz orientação pedagógica.


Ricardo: Júlia, eu sei que tudo começou como um grupo de estudos né, que era relacionado ao meio acadêmico. Como que isso saiu de um grupo de estudos para um grupo de extensão?


Júlia: Então, tudo bem Rick? Tudo bem com todo mundo? Bom, esta história, na verdade, começa em 2013 quando eu entrei em Ciências Sociais. Eu já tinha muita vontade de trabalhar com educação, mas ali no curso ainda não tinha muitos espaços assim feitos. Uma das gestões do centro acadêmico, na época, ela se preocupava muito em fazer núcleos temáticos, ou seja, eram pessoas do cursos interessados em discutir aquilo. E aí, eu fazia parte do meio do movimento estudantil e fiquei responsável pelo meu grupo de tratar sobre extensão. Em 2015, quando eu comecei a participar do grupo, a gente tinha alguns encontros que eram bem teóricos e a gente discutia e lia Paulo Freire, mas ainda não tínhamos nenhum projeto.


Ricardo: Júlia, você disse que foi atrás da escola, para poder dar essas aulas de sociologia. Como vocês encontraram a primeira escola de atuação? Porque vocês escolheram essa escola? Como foi essas primeiras experiências de chegar nessa escola sem saber exatamente como fazer extensão?


Júlia: Nós éramos em três pessoas: eu e mais duas ou três pessoas. Eu peguei uma lista na internet, das escolas estaduais da região próxima da USP, e a gente pegou o carro e começamos a ir em cada uma dessas escolas sem nada, não tínhamos nenhum professor orientando, a gente não tinha nada, a gente só tinha a cara mesmo, lavada. E a gente ia nas escolas e, o pior, a gente não tinha nem um projeto direito! Então batíamos mesmo na porta das escolas e falamos que queríamos conversar com a diretora. Fomos em umas dez escolas dizendo que queríamos desenvolver um projeto de sociologia na escola. Porém, queríamos construir o projeto com os alunos, professores de sociologia também.

Tivemos uma dificuldade gigantesca, primeiro com a diretoria, de atender a gente, porque às vezes não conseguimos passar nem da porta. Foi quando passamos em duas escolas, que foram Rosa Bonfim e uma outra escola que a diretora topou, ela super animada. Mas só que ela falou para conversarmos com a professora de sociologia e foi quando marcamos uma reunião e, nesse dia, acho que eu fiquei doente e não podia estar, mas foram dois outros integrantes, estavam com a gente o Rafael e o Pedro. Eles foram na reunião e disseram que foi terrível, porque a professora detonou a ideia, falou que ela não precisava de pessoas da USP lá.

Então, foi assim, uma rejeição gigantesca. Sobrou só o Rosa, que na verdade, disseram para nós que a escola estava aberta, pode vir. Quando começamos, não tinha sala, porque eles falaram que não tinha sala durante a tarde toda, todas as salas estavam ocupadas. Aí a gente ficou na mesa do refeitório da escola, no pátio, e a gente teve o professor de sociologia para divulgar nosso projeto. Ele falou para os alunos, em uma tarde, tal dia da semana que vai ter um pessoal da USP fazendo um projeto aí.. Foi quando, duas pessoas ou uma pessoa aparecia. Era muito triste, esse começo, mas aí com o tempo a gente foi se estruturando melhor. Esse foi um pouco do nosso início, sabe?



Ricardo: Eu sei que teve uma oficina que lotou desde o começo né?


Júlia: Exatamente, foi nesse momento de transição. Porque no início, a gente estava assim né, já tínhamos a leitura do Paulo Freire e foi tão importante ter a teoria, mas a gente também precisava ir para a prática, tínhamos pouco contato com o lecionar. A gente tinha uma ideia de que não precisava de planejamento, vamos lá e conversar com os alunos, partindo dos temas que surgirem, a gente vai discutindo.

Por conta disso, surgiu uma insatisfação por parte dos alunos, porque eles não entendiam o que estava rolando, era um formato totalmente diferente da escola que eles tinham. Então foi o momento que a gente conversou entre a gente, que precisava estruturar melhor essas aulas, as oficinas ou propor um tema. Enfim, atuar também com um papel de mediador, por que não é que você tá ali propondo um tema que você está impondo um tema às pessoas, enfim, a educação pode ser dialógica e também de ter um mediador ali. Então a gente decidiu fazer um planejamento e conversamos com o professor de sociologia Sérgio. Fomos durante o período da manhã, durante a aula dele, e a gente aplicou algumas oficinas.

Fizemos a oficina sobre os povos indígenas no primeiro ano, de uma maneira muito lúdica, pedimos para fazerem desenhos de como a imagem de um indígena vinha na sua cabeça. E discutimos o porquê daquela imagem estereotipada. E aí, no terceiro ano, era um debate sobre um tema político, que simulamos um júri, uma coisa mais ligada à ciência política. E no segundo ano, foi a nossa histórica ou primeira vez que a gente bolou a Oficina da pipa.


Ricardo: A famosa oficina da Pipa!


Júlia: Super famosa né, a gente simulou a linha de montagem de uma fábrica, aí tinha uns grupos que competiam entre eles e tinha a parte da dinâmica. Explicamos os conceitos de Marx. Só que assim, imagina, os adolescentes saiam com a pipa da atividade na mão e aí todas as turmas queriam fazer a Oficina da pipa. Então, a gente falava, olha essa é uma oficina experimental.. venham à tarde que vai ter mais! Foi quando na outra semana que a gente fez a divulgação, apareceram mais de 63 alunos numa sala de aula minúscula. E aí foi aquele caos, por que a gente não tinha experiência como professor, imagina a loucura que foi esse dia! Depois, para controlar também, a gente selecionou que seria só o primeiro ano que iriam participar, já que queríamos os acompanhar durante o restante dos anos escolares.

O Sérgio, professor de Sociologia, começou então a dar meio ponto a mais na nota final de quem participasse das oficinas, e começou a ter uma coisa mais burocrática de incentivo para eles irem nas oficinas, foi quando a gente acertou e controlou uma média de 30 alunos que apareciam na sala de aula. Mas depois foi caindo um pouco. Mas acho que é nosso perfil, que você também acompanhou Rick, que era muito rotativo. Os alunos tinham os alunos que sempre estavam presentes, mas tinha muita gente que ia e voltava.

Foi assim que a gente começou a planejar melhor as oficinas e pegar os temas que surgiam, estruturando um pouco melhor o projeto por meio da prática e da experiência que fomos ganhando. Foi nesse momento, que a gente começou a ter mais oficinas de gênero, drogas e temas polêmicos, mas trazemos também conceitos e temas que a Sociologia ajuda a compreender e a entender, sempre tentando fazer dinâmicas com temas legais para eles. Foi aí, meio que no ano de 2015/2016, a gente se estruturou mesmo, enquanto ao projeto, sabendo o que a gente queria fazer. Outro marco maior foi quando a gente começou com a bolsa PUB, com a Márcia.


Toca-se a melodia de transição entre quadros, Josefina de Quincas Moreira, em ritmo de forró.


Ricardo: Já falando da Márcia né, até agora a gente tá falando só como nasceu o projeto no curso de Ciências Sociais dentro da USP. E a pergunta é cabeluda né (risadas), porque a essa orientação acabou indo para a faculdade de educação? E como você acredita que isso tenha impactado com o grupo? Você acha que seria muito diferente se a gente tivesse orientação dentro da Ciências Sociais?



Júlia: Ah eu acho que sim né, é uma pergunta cabeluda, porque o objetivo não é ficar ressentido, nem com remorso, do que aconteceu no início, mas tentar entender o por que isso aconteceu também. Quando a gente em 2016 já tinha um projeto que toda semana tinha que ir na escola, tinha tarefa, tinha reunião, por que é um grupo, não adianta eu na minha casa estruturar uma oficina, tinha que ser em grupo, tinha que discutir juntos. Assim, com muitas atividades percebemos que não era viável continuar assim de maneira voluntária, então que a gente deveria procurar uma bolsa ou uma orientação, alguma coisa assim.

Aí a gente foi primeiro nos professores de Ciências Sociais, tanto os de sociologia quanto os de antropologia e política, muitos adoravam a ideia e tal, mas diziam que não tinham disponibilidade para orientar, nem para escrever o projeto né. Foi aí quando o Rafael que já tava na licenciatura falou: “nossa mas tem a professora Márcia que dá Metodologia de Sociologia na licenciatura, então talvez ela tope né”. E ela já falou que topava, que iria escrever e fazer junto. Já tava muito em cima da data né, do edital, mas a gente escreveu o projeto e mandou pra ela, ela revisou e alterou algumas coisas e deu super certo! Foi muito legal! Eu acho que é um pouco isso, é reflexo das ciências sociais, principalmente na USP, ser muito teórica e muito voltada para formação acadêmica. A gente nunca lhe dou muito bem com a nossa licenciatura.

A partir das bolsas a gente se estruturou de uma forma muito melhor e conseguiu não só o apoio para conseguir continuar com o projeto, com as bolsas, mas também conseguimos parceria de fazer excursão, uma série de trabalhos e lugares que a gente foi com os alunos das escolas com parceria da USP. Levamos eles para Escola Florestan Fernandes, a gente foi para a comunidade indígena. A gente saia dos muros da escola né, com eles, e isso consolidou uma relação com alguns alunos que se mantinham ali e o projeto se tornou um espaço de acolhimento dentro da escola. No início era, se você ficou de recuperação vai no grupo de sociologia que você vai ganhar um ponto a mais. Então a gente tinha muito dos alunos considerados “os piores” entre aspas né porque eu não concordo com isso. Mas entre os piores alunos da escola né. E no início, eles quase não falavam. Eles eram muito tímidos, eles se excluíram de muitas atividades. E com o tempo eles foram percebendo que era um espaço seguro. Eu que pude estar no começo e depois pude também estar no final, até 2017, eu os vi florescendo, você via ela super comunicativos, super falantes, participantes. Para mim o auge assim, que eu falei dever cumprido, eu posso entregar pros próximos integrantes, que vai rolar, vai dar certo, foi uma das últimas oficinas que eu participei no final do projeto, que foi quando a gente desenvolveu o mapa dos lugares que, envolta das escolas que eles queriam apresentar para gente, fizemos um roteiro com eles e depois, outro dia, a gente saiu para caminhar com esse roteiro e ideia era que eles apresentassem o bairro para gente, eu não sei se você já estava nessa época.


Ricardo: Eu tava, eu tava.


Júlia: Então, e por isso que para mim foi um marco de realização mesmo, enquanto educadora. Quando a gente saiu do portão da escola e eles cruzaram, a escola fica em um bairro em Osasco que cruza com outro bairro de classe média alta, o Parque dos Príncipes, e Osasco sendo uma parte mais periférica, a gente cruzou o muro que divide o Parque dos Príncipes, e nessa hora, que a gente pisou ali, os policiais vieram nos abordar e aí a gente já enfrentou uma série de questões que a gente batia na sala de aula, na prática. E aí eu lembro que a gente foi saindo e eles foram discutindo isso, falando da violência policial e uma outra série de questões que aquele dia suscitou, que são questões né, da sociologia e que ajuda a gente entender e a explicar o que estávamos vivendo ali, agora, de onde eles moravam e eles querendo mostrar os lugares que se reúnem, o bar que eles se juntam, as biqueiras também, o córrego, o conjunto de habitação, uma série de coisas da vida deles que a gente falou: “meu, vamos levar isso para as oficinas, porque são temas muito ricos para gente debater junto com a sociologia.” Aí eu acho que Paulo Freire tava feliz ali. Então, finalmente a gente consolidou pelo menos um ciclo que foi muito importante do nosso projeto naquela escola. Isso é um pouco de toda a minha bagagem e que me formou, a gente não só formou eles, mas a gente também se formou. Acho que muito da minha prática profissional hoje é por conta do Sociologia em Movimento, minha graduação também foi lá né, então acho que é isso.


Ricardo: Então tá certo Ju, muito obrigado!


Júlia: Obrigada você!


Agora, a gente vai falar com a Márcia, que é a nossa orientadora, que a Ju até falou aqui, até comentou. E ela vai falar um pouco mais sobre essa coisa que eu comentei entre essa ponte entre a licenciatura e o bacharelado que é bem distante na USP.


Júlia: É gente, é isso, obrigada! Vejam também as oficinas que a gente tem, esses materiais no site. Para eventuais professores que estejam nos ouvindo, acesse o material, é bem legal de consultar e pode acrescentar e pensar para as aulas.


Toca-se a melodia de transição entre quadros, Josefina de Quincas Moreira, em ritmo de forró.


Márcia: Olá pessoal do Sociologia em Movimento, do Sociologia em Podcast. Eu vou agradecer e iniciar essa breve fala agradecendo muito pelo convite que vocês me fizeram e vou aqui tentar responder as questões que vocês estão trazendo. Uma dessas questões, é como eu aceitei né, eu sou a Márcia Gobbi, e estou junto de vocês já alguns anos, no Projeto Unificado de Bolsas (PUB) no projeto Sociologia em movimento. E aí vocês me perguntam como é que eu aceitei em orientá-las e orientá-los. Bom, o que eu posso dizer para vocês? Acho que isso é fruto de um feliz, muito feliz, encontro proporcionado pela Júlia Audujas, então estudante da licenciatura e bacharelado em Ciências Sociais, que me contou a história (isso foi um final de aula aula de metodologia do ensino em Ciências Sociais) e ela me contou a história, que tava ainda em início do grupo Sociologia em Movimento, e fez pra mim a proposta de orientar esse grupo como extensão. Entre várias conversas, aceitei, especialmente por acreditar na importância da Extensão Universitária e muito na proposta que já estava bastante delineada pelo grupo. É verdade que vocês me colocam no colo, uma proposta, que depois foi sendo burilada, mas que já estava bastante encaminhada e bastante sedutora, bastante bacana mesmo! Que surgiu a partir da preocupação de estudantes de Ciências Sociais com a formação em Ciências Sociais nas escolas públicas de São Paulo de ensino médio. E isso eu tô chamando de bastante original. Então encontro nisso, uma maneira de se tornar presente determinados temas que não estariam cotidianamente presentes na sala de aula, em formato de oficinas - que me pareceu na época e ainda me parece, que repito, bastante originais, um processo de criação riquíssimo -. Desde então, estamos juntos buscando ampliar e refletir bastante sobre essas ações e projetar outras. Talvez nesse sentido, há algo que permanece,do projeto inicial. Mas ele também foi sofrendo uma série de transformações. E atualmente compreendo que, embora tenhamos o projeto como uma atividade extensionista, fundamentalmente de extensão, envolvemos também pesquisa e eu diria até formação de professores, mas eu diria pesquisa. A pesquisa mais recentemente, isso em relação com a pós-graduação, o desenvolvimento do projeto de Mestrado da Mairin, que estudou o grupo. Ou seja, o grupo já está num processo de constituir história de jovens que vão materializando propostas do grupo e isso se torna objeto também de pesquisa, de investigação, no mercado da Mairin. Então, quando vocês me perguntam como eu aceitei orientá-las, eu fico pensando que há algo que é bastante importante nessa relação entre pesquisa e extensão e a formação, né, docente/ensino estão, em grande medida, organizados, ainda que em transformação, sendo objetos das nossas reflexões, sendo um constante processo de formação, mas que tem a educação básica como como essa fonte que vão nutrindo as propostas, dirigindo as mudanças, mudanças criativas e, enfim, nossas. Eu aceito estar junto de vocês na composição desse projeto que muito me orgulha, muito me honra, estar junto de vocês nisso. Me deixa muito feliz e muito instigada a continuar e colaborar com esse projeto.


Toca-se a melodia de transição entre quadros, Josefina de Quincas Moreira, em ritmo de forró.


Márcia: Bom, agora vocês trazem uma outra questão, que é sobre a importância da formação de professores e professoras de Sociologia pro ensino médio. Isso é uma pergunta, que uau! exige um tempão enorme para resposta. Então eu opto aqui, dentro do possível, ser breve. Eu penso que resgatar algumas questões próprias das disciplinas escolares. Pensando que a história das disciplinas escolares nos leva a refletimos sobre a nossa, a disciplina escolar de Sociologia. Sabe-se que as disciplinas escolares não existiram desde sempre. Elas foram histórica e socialmente criadas em resposta a certas finalidades atribuídas às escolas ao longo do tempo e o seu surgimento, que na verdade é construída historicamente. E essa construção histórica e social, se dá também no cumprimento de demandas. É legal pensar que as disciplinas atendem as demandas sociais. Essa afirmação está contida no artigo “História das disciplinas escolares” do André Chervel. Para nós, ela é importante para a gente poder contextualizar e pensar um pouquinho, não só somente na nossa disciplina, mas num conjunto de construções das disciplinas escolares em que as nossa também se encontra. Então, com esse autor, podemos pensar que ao longo da história, a sociedade, o estado, o capital, vão atribuindo finalidades, de ordens religiosas, sócio-políticas, culturais diversas, de processos de socialização, de guarda da própria memória, da escola…E as disciplinas escolares, em certa medida, compre, em certas demandas, essas finalidades delegadas, havendo outras, é claro.

Essas demandas vão mudando. Essas finalidades atribuídas às escolas e as próprias disciplinas vão se modificando. Isso explicaria porque certas disciplinas foram criadas e desaparecendo, ou mudando seus conceitos, conteúdos e formas didáticas, por exemplo. Com isso, se a gente pensar, podemos por exemplo pensar a intermitência da própria disciplina Sociologia em nossos currículos. Ou ainda, observamos a presença da educação moral e cívica e ação social e política no Brasil, como disciplinas presentes ao longo da ditadura no Brasil, em 1960, que correspondem a certas demandas, né? E que merecem e exigem de nós, uma série de reflexões mais aprofundadas. Agora, por exemplo, mais recentemente, nós temos em São Paulo algo como O projeto de Vida e Empreendedorismo como disciplinas escolares que, pasmem, passariam a compor itinerários formativos de estudantes no ensino médio Paulista. Juntadas num único pacote já anunciado, que revela certa desqualificação e desconsideração das ciências humanas e da sociologia, em particular, ao não tratá-la como componente curricular e suas especificidades no processo de formação dos/das estudantes. E aí eu volto com isso, para uma reflexão inicial que estava meio entre as entrelinhas dessa primeira reflexão. Quais as demandas atuais? Que nós temos? A julgar por essas propostas, brevemente anunciadas, as finalidades seriam exclusivamente: a formação de mão de obra para o trabalho – e para um tipo de trabalho – no qual para as Ciências Sociais não faria sentido. Para as ciências humanas, eu diria, não faria sentido. Eu estou me referindo as novas propostas de currículos. Se considerarmos questões que gritam aos quatro ventos, tais como o racismo, fascismo, massacre da população indígena, questão de moradia, gênero, violência contra mulher, questões relacionadas à infância, homofobia, entre outros, até a própria História do Pensamento e os princípios epistemológicos que caracterizam o ensino e as pesquisas. Isso nos mostra que não podemos reduzir processos formativos à uma formação de mão de obra barata em certos setores da sociedade, como agronegócio e donos de capital, entre outros. Trata-se de questionar a quem servimos e a demanda desses setores está sendo privilegiada. Trata-se de questionar as nossas composições curriculares e, nela, a nossa disciplina. Retomo, para finalizar, que o processo de formação de professores e professoras – e aqui em destaque de sociologia do ensino médio – implica pesquisa e ensino, implica metodologias e recursos que podem orientar o ato de ensinar. Repito, considerando questões particulares da nossa disciplina – e que não são dispensáveis –, o estranhar, problematizar, pensar em recursos didáticos específicos, tratar e constituir a imaginação sociológica, conceitos, e teorias não podem ser colocadas de lado! Isso urge e compõem os processos de transformação de professoras e professores. O que é tão importante como já sabemos mas que em alguns momentos parece que escapam dos conjuntos das nossas preocupações nos processos de formação de professores. E é isso que há na sua especificidade das formações dos professores e professoras em ciências sociais, para a disciplina escolar de sociologia.


Sofia: Vamos ouvir mais agora de Mairin Sato. Ela estudou nossa atuação por mais de um ano e escreveu uma tese de Mestrado sobre Juventude e Sociologia. Oi Mairin, tudo bem? Você pode se apresentar para gente?


Mairin: Claro, meu nome é Mairin, sou formada em Ciências Sociais na FFLCH-USP. Comecei fazendo bacharelado e depois resolvi fazer também a licenciatura e depois um pouco fiz mestrado na Faculdade de Educação em Sociologia da Educação.


Sofia: Você pode falar um pouquinho para gente como você conheceu o Sociologia em Movimento?


Mairin: Quem me apresentou o Sociologia em Movimento foi a minha orientadora do Mestrado, a professora Márcia Gobbi, da Faculdade de Educação na USP, que também é a orientadora do Sociologia em Movimento. Na época, que foi no final de 2016 e início de 2017, eu estava começando meu mestrado, tava no primeiro ano, e eu precisava definir qual seria o meu campo de pesquisa, onde eu iria coletar os dados. Como o meu projeto era sobre Sociologia no Ensino Médio, a Márcia me deu algumas sugestões de locais, de grupos, que poderiam interessar e eu também fui pensando em algumas alternativas, em conhecer e explorar para ver o que me interessava na pesquisa. Então foi nessa ocasião que a Márcia me falou do Sociologia em Movimento, explicou um pouco sobre as atividades do grupo e que ela também tinha acabado de assumir a orientação do grupo como projeto de extensão. Daí ela me passou o contato da Júlia, que foi a fundadora, e me convidou a conhecer e participar das reuniões, na FFLCH, e depois também fui nas oficinas no Rosa e, foi assim, que eu fui conhecendo o grupo. Me encantei realmente com a proposta e com o trabalho e segui fazendo a pesquisa com Sociologia em Movimento.


Sofia: Como você enxerga a importância do desenvolvimento da imaginação sociológica para a formação da pessoa na sociedade?


Mairin: Bom, isso para mim é muito importante e fundamental. Desenvolver o olhar sociológico é imprescindível na formação de qualquer pessoa nos dias atuais, não só quem vai trabalhar na área de humanas e ciências sociais, enfim, não acho que seja só uma questão de formação profissional, mas de formação pessoal mesmo. Isso falo assim nos dias atuais, mas não só por causa da pandemia, a pandemia deixou muito evidente que a gente precisa realmente entender o mundo que a gente vive, o tipo de sociedade que a gente vive, como ela nos afeta e como nossas ações também fazem diferença em várias esferas. A gente vê por exemplo que precisa saber votar, que precisa saber escolher Governador de acordo com o que a gente pensa, vê a importância do SUS, do sistema de saúde, da saúde pública. E também na área da Educação, a gente vê que tem um abismo enorme entre o que tá acontecendo agora nas escolas públicas e nas escolas privadas. Então já apareceu muitas vezes né na mídia, desde o início da pandemia, sobre o quanto essa pandemia escancarou as desigualdades sociais. E as pessoas precisam saber se posicionar. Com um olhar sociológico qualquer um tem base, tem recurso para tomar decisões, para fazer questionamentos, para entender o que tá acontecendo, o que são essas notícias que aparecem no jornal, o que são as coisas que a gente vê quando sai na rua. Enfim, entender a vida né, no mundo real, que a gente consegue tomar decisões sobre questionamentos, escolher, interferir, e ir atrás de mudar o que acha que pode e deve ser mudado. Enfim, a gente entende que o mundo não foi sempre assim e não vai ser sempre assim, simplesmente por natureza ou vontade divina, as coisas são assim por que foram feitas assim, porque as pessoas construíram dessa forma. Então, eu particularmente penso que as pessoas quando elas têm um olhar sociológico, uma imaginação sociológica, como a gente fala nas sociais, elas se tornam mais abertas mais sensíveis ao debate de temas de interesse geral, de interesse público, coletivo. Elas estão mais abertas para sair um pouco da sua vida individual, particular, do seu mundo imediato, da vida do dia a dia. E é um debate que eu acho que é difícil de acontecer quando a pessoa não tem esse olhar sociológico, quando ela não vê uma conexão entre a vida dela e a vida da sociedade. Então eu acho que é uma outra coisa que me faz pensar, é como é importante a gente investir no desenvolvimento desse olhar sociológico.


Sofia: achei muito linda essa sua fala, gostei, gostei muito! Como a sua pesquisa viu a importância da sociologia para instigar os jovens a atuar na vida social?


Então: A minha pesquisa mostrou que a disciplina Sociologia no ensino médio, não foi sempre, entre os que eu pesquisei, a principal fonte de motivação para atuar na vida social. Para alguns, foi sim, mas não foi para todo mundo. E por que? Não foi porque o principal fator, é na verdade, o professor ou a pessoa que tá ali encarregada de conduzir a disciplina que precisa ter esse foco, se não for com esse foco, não vai ter esse resultado né? Não necessariamente. Pela pesquisa deu para ver muito bem que depende muito da conduta do direcionamento do professor. O professor é um fator primordial e muito importante para acontecer esse desenvolvimento do olhar sociológico. Então, por outro lado, outros professores, de outras disciplinas, acabam às vezes, fazendo esse papel. Sendo professores de Filosofia, de História ou de Geografia que acabou despertando no alunos essa vontade de conhecer mais da realidade, de saber como é que acontece essa conexão, essa experiência múltipla entre o pessoal e coletivo. Então, foi por aí que alguns acabaram construindo essa imaginação sociológica ou acabaram, assim, começando a ter interesse despertado.

Em outros casos não foi tanto pela escola, pelas disciplinas, mas foi pela experiência da vida mesmo, pelas questões sociais que estão em todos os lugares. Às vezes é no debate, numa reunião de cunho mais religiosa, às vezes na música, no rap, enfim, em outros lugares as pessoas se sensibilizam, se interessam, e começam a estudar, a pesquisar, e ir atrás. E acabam chegando na sociologia como uma ciência, que trata das questões sociais de uma maneira sistemática e fundamentada. E aí eles vão atrás para ter base, conhecer teorias né? E vão por aí desenvolvendo uma imaginação sociológica. Mas eu acho que a disciplina na escola, no ensino médio, pelo menos tem uma importância de preservar um lugar no tempo e no espaço do ambiente escolar para esse tipo de reflexão, para esse tipo de debate, para pensar questões sociais. Inclusive às vezes questões e coisas que acontecem dentro da própria escola, que podem servir para se começar a despertar os estudantes e jovens perceberem que existe uma conexão entre as questões sociais, que são naturalizadas, que estão rasgadas e que ninguém se dá conta de como elas surgiram, pensam que sempre foi assim e sempre vai ser. E aí mais uma vez, vai depender do professor né? De conseguir aproveitar essas oportunidades para dar lugar a esse tipo de reflexão, desenvolvimento, de debate.


Sofia: Obrigada Mairin, tchau!


Mairin: Obrigada vocês! tchau!


Toca a melodia de Bongo Madness, de Quincas Moreira.


Maria: Você sabia que a gente já foi para Argentina contar sobre o nosso método de ensino? Em 2018 participamos da CLACSO, conferência latino-americana de Ciências Sociais. A maior conferência de Ciências Sociais do mundo. A experiência foi super legal! Você, que quer saber mais sobre nosso trabalho, pode conferir uma série de vídeos que fizemos nesta viagem! No nosso canal do YouTube e também pelo Facebook, você pode procurar pela playlist #RumoaCLACSO! O link também estará disponível na descrição no podcast.


Rick: Falando nisso, todas as referências bibliográficas e sobre a vida de nossos convidados estarão no nosso site. E na semana que vem, estaremos numa discussão polêmica aqui no Sociologia em podcast.


Gabriel: É comum nas redes sociais, pessoas falarem que Paulo Freire destruiu a educação brasileira. Mas será mesmo?


Sofia: Juntas, vamos discutir o porque esse tema, de que Paulo Freire destruiu a educação brasileira, está em alta em alguns nichos e quanto de Paulo Freire foi realmente aplicado, pelo Estado Brasileiro, nas políticas de educação.


Rick: E por hoje é só pessoal! Você pode nos acompanhar seguindo no Facebook ou no Instagram, é só pesquisar Sociologia Em Movimento. Até mais!


Começa vinheta de encerramento, Bongo Madness de Quincas Moreira, em ritmo caribenho.


Créditos: Esse podcast é uma iniciativa do Sociologia em Movimento, grupo de extensão da Faculdade de Educação da USP, orientada pela Professora Márcia Gobbi e financiado pelo Programa Unificado de Bolsas. Editado por Lucas Pintto, Ricardo Freire e Verônica Lopes. Roteiro de Jerônimo Favaretto, Sofia Maria Barreto e Ricardo Freire.


Música de vinheta de encerramento aumenta. O áudio termina.



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