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Foto do escritorRicardo Freire

Fichamento: Pedagogia do Oprimido

Atualizado: 4 de set. de 2021

O Sociologia em Movimento está organizando encontros de estudo junto com o II Simpósio de Educação e Ciências Sociais, com o intuito de colaborar com a interdisciplinaridade da área. O autor escolhido para leitura é Paulo Freire, mas apesar do texto ser relativamente curto sabemos que a vida é muito corrida e que fica complicado conciliar as leituras de aula com leituras extra para lazer outras atividades.



Por isso escolhemos um fichamento de "Pedagogia do Oprimido", assim você pode se inteirar do assunto pra não chegar boiando no encontro. Mas se você puder ler a obra completa, sempre é melhor, tá?



 

Fichamento de Pedagogia do Oprimido


Baseado em:

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido.

28 ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.



Paulo Freire é um pensador comprometido com a vida: não pensa ideias, pensa a existência. E

também educador: existência seu pensamento numa pedagogia em que o esforço totalizador

da “práxis” humana busca, na interioridade desta, retotalizar-se como “prática da liberdade”.


Por isto, a pedagogia de Paulo Freire, sendo método de alfabetização, tem como ideia

animadora toda a amplitude humana da “educação como prática da liberdade”, o que, em

regime de dominação, só se pode produzir e desenvolver na dinâmica de uma “pedagogia do

oprimido”. (p. 05)


Constatar esta preocupação implica, indiscutivelmente, em reconhecer a desumanização, não

apenas como viabilidade ontológica, mas como realidade histórica. É também, e talvez,

sobretudo, a partir desta dolorosa constatação que os homens se perguntam sobre a outra

viabilidade – a de sua humanização. (p. 16)


A superação da contradição é o parto que traz ao mundo este homem novo não mais opressor;

não mais oprimido, mas homem libertando-se. Contudo, não podemos eclipsar o fato de que

essa libertação não acorre gratuitamente. (p. 17)


Pelo contrário, a realidade opressora, ao constituir-se como um quase mecanismo de absorção

dos que nela se encontram, funciona como uma força de imersão das consciências. Neste

sentido, em si mesma, esta realidade é funcionalmente domesticadora. (p. 19)

A pedagogia do oprimido que, no fundo, é a pedagogia dos homens empenhando-se na luta

por sua libertação, tem suas raízes aí. E tem que ter nos próprios oprimidos que se saibam

ou comecem criticamente a saber-se oprimidos, um dos seus sujeitos. A pedagogia do

oprimido, que busca a restauração da intersubjetividade, se apresenta como pedagogia do

Homem. (p. 22)


A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois momentos

distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão

comprometendo-se na práxis com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a


realidade opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos

homens em processo de permanente libertação. (p. 23)


Com efeito, os opressores vão sentir-se, agora, na nova situação, como oprimidos porque, se

antes podiam comer, vestir, calçar, educar-se, passear, ouvir Beethoven, enquanto milhões

não comiam, não calçavam, não vestiam, não estudavam nem tampouco passeavam, quanto

mais podiam ouvir Beethoven, qualquer restrição a tudo isto, em nome do direito de todos,

lhes parece uma profunda violência a seu direito de pessoa. (p. 25)

Pretender a libertação deles sem a sua reflexão no ato desta libertação é transformá-los em

objeto que se devesse salvar de um incêndio. É fazê-los cair no engodo populista e

transformá-los em massa de manobra. O diálogo critico e libertador, por isto mesmo que

supõe a ação, tem de ser feito com os oprimidos, qualquer que seja o grau em que esteja a luta

por sua libertação. Ao defendermos um permanente esforço de reflexão dos oprimidos sobre

suas condições concretas, não estamos pretendendo um jogo divertido em nível puramente

intelectual. Estamos convencidos, pelo contrário, de que a reflexão, se realmente reflexão,

conduz à prática. (p. 29)


Não há outro caminho senão o da prática de uma pedagogia humanizadora, em que a

liderança revolucionária, em lugar de se sobrepor aos oprimidos e continuar mantendo-os

como quase “coisas”, com eles estabelece uma relação dialógica permanente. Educador e

educando (liderança e massas), co-intencionados à realidade, se encontram numa tarefa em

que ambos são sujeitos no ato, não só de desvelá-la e, assim, criticamente conhecê-la, mas

também no de recriar este conhecimento. (p. 31)


Quanto mais analisamos as relações educador-educandos, na escola, em qualquer de seus

níveis, (ou fora dela), parece que mais nos podemos convencer de que estas relações

apresentam um caráter especial e marcante – o de serem relações fundamentalmente

narradoras, dissertadoras. A narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à

memorização mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em

“vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Surge, portanto, uma educação

que continua conformando o educando. Quando tenta integrá-lo a uma realidade que existe

para fora dele, configura, dessa maneira, mais um instrumento de domesticação, uma vez que

ele não aprende a recontar sua realidade com seus próprios matizes, mas mimetiza tudo o que

foi memorizado. (p. 33)


A educação como prática da dominação, que vem sendo objeto desta critica, mantendo a

ingenuidade dos educandos, o que pretende em seu marco ideológico, (nem sempre percebido

por muitos dos que a realizam) é doutriná-los no sentido de sua acomodação ao mundo da

opressão. (p. 38)


Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens

se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos

cognoscíveis que, na prática “bancária”, é possuída pelo educador que os descreve ou os

deposita nos educandos passivos. (p. 39)


A educação como prática da liberdade, ao contrário daquela que é prática da dominação,

implica na negação do homem abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim também na

negação do mundo como uma realidade ausente dos homens. Neste modelo de educação o

diálogo é item inarredável do ato cognoscente. (p. 40)


Por isto é que esta educação, em que educadores e educandos se fazem sujeitos do seu

processo, superando o intelectualismo alienante, superando o autoritarismo do educador

“bancário”, supera também a falsa consciência do mundo. Nenhuma “ordem” opressora

suportaria que os oprimidos todos passassem a dizer: “Por quê?” (p. 43)


Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão do mundo, ou tentar impô-la a ele, mas

dialogar com ele sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que a sua visão do

mundo, que se manifesta nas várias formas de sua ação, reflete a sua situação no mundo, em

que se constitui. A ação educativa e política não pode prescindir do conhecimento crítico

dessa situação. (p. 49)


Contudo, o que se pretende investigar, realmente, não são os homens, como se fossem peças

anatômicas, mas o seu pensamento-linguagem referido à realidade, os níveis de sua percepção desta realidade, a sua visão do mundo, em que se encontram envolvidos seus “temas geradores”. (p. 50)


Para dominar, o dominador não tem outro caminho senão negar às massas populares a práxis

verdadeira. Negar-lhes o direito de dizer sua palavra, de pensar certo. Esse quadro existe

como condição necessária na situação de dominação, em que a elite dominadora „prescreve e

os dominados seguem as prescrições. Do mesmo modo, uma liderança revolucionária, que

não seja dialógica com as massas, ou mantém a “sombra” do dominador “dentro” de si e não é


revolucionária, ou está redondamente equivocada e, presa de uma setarização indiscutivelmente mórbida, também não é revolucionária. (p. 71)


Podem visualizar a revolução como a sua revolução privada, o que mais uma vez revela uma

das características dos oprimidos, sobre que falamos no primeiro capítulo deste ensaio. A

nossa convicção é a de que, quanto mais cedo comece o diálogo, mais revolução será. (p. 72)


O diálogo com as massas não é concessão, nem presente, nem muito menos uma tática a ser

usada, como a sloganização o é, para dominar. O diálogo, como encontro dos homens para a

“pronúncia” do mundo, é uma condição fundamental para a sua real humanização. (p. 76)


O que interessa ao poder opressor é enfraquecer as oprimidos mais do que já estão, ilhando-

os, criando e aprofundando cisões entre eles, através de uma gama variada de métodos e

processos. Desde os métodos repressivos da burocracia estatal, à sua disposição, até as formas de ação cultural por meio das quais manejam as massas populares, dando-lhes a impressão de que as ajudam. (p. 80)


A necessidade de dividir para facilitar a manutenção do estado opressor se manifesta em todas

as ações da classe dominadora. Sua interferência nos sindicatos, favorecendo a certos

“representantes” da classe dominada que, no fundo, são seus representantes, e não de seus

companheiros; a “promoção” de indivíduos que, revelando certo poder de liderança, podiam

significar ameaça e que, “promovidos”, se tornam “amaciados"; a distribuição de benesses

para uns e de dureza para outros, tudo são formas de dividir para manter a "ordem” que

lhes interessa. (p. 81)


Se, na teoria antidialógica da ação, se impõe aos dominadores, necessariamente, a divisão dos

oprimidos com que, mais facilmente, se mantém a opressão, na teoria dialógica, pelo

contrário, a liderança se obriga ao esforço incansável da união dos oprimidos entre si, e deles

com ela, para a libertação. (p. 99)


Significando a união dos oprimidos à relação solidária entre si, não importam os níveis reais

em que se encontrem como oprimidos implica esta união, indiscutivelmente, numa

consciência de classe. (p. 100)


Com efeito, descobrem que, como homens, já, não podem continuar sendo “quase coisas”

possuídas e, da consciência de si como homens oprimidos, vão à consciência de classe

oprimida. Mas para que os oprimidos se unam entre si, é preciso que cortem o cordão

umbilical, de caráter mágico e mítico, através do qual se encontram ligados ao mundo da

opressão. (p. 101)


Enquanto, na teoria da ação antidialógica, a manipulação, que serve à conquista, se impõe

como condição indispensável ao ato dominador, na teoria dialógica da ação vamos encontrar,

como que oposto antagônico, a organização das massas populares. Este testemunho constante, humilde e corajoso do exercício de uma tarefa comum – a da libertação dos homens – evita o risco dos dirigismos antidialógicos. (p. 102)


O que pretende a ação cultural dialógica, cujas características estamos acabando de analisar,

não pode ser o desaparecimento da dialeticidade permanência-mudança (o que seria

impossível, pois que tal desaparecimento implicaria no desaparecimento da estrutura social

mesma e o desta, no dos homens), mas superar as contradições antagônicas de que resulte a

libertação dos homens. (p. 104)


Isto implica em que a síntese cultural é a modalidade de ação com que, culturalmente, se fará

frente à força da própria cultura, enquanto mantenedora das estruturas em que se forma. Desta

maneira, este modo de ação cultural, como ação histórica, se apresenta como instrumento de

superação da própria cultura alienada e alienante. (p. 105)


A colocação que, em termos aproximativos, meramente introdutórios, tentamos fazer da

questão da pedagogia do oprimido, nos trouxe à análise, também aproximativa e introdutória,

da teoria da ação antidialógica, que serve à opressão e da teoria dialógica da ação, que serve à

libertação. (p. 107)


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